Glória Fácil...

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quinta-feira, novembro 30

tapetes de arraiolos

caríssimo vlx (do mar salgado), vai-me desculpar, mas essa recusa em admitir que o que está em causa no referendo tem obviamente a ver com a lei que já existe (não sei se já reparou mas está em causa acrescentar uma alínea à lei, não fazer outra diferente) é um bocadinho, como dizer?, infantil.

quer isto dizer, obviamente, que é importante compreender qual o espírito e o fundamento da lei vigente para discutir a alteração.

quanto ao seu notável desconhecimento sobre tudo o que diz respeito à matéria, nomeadamente sobre o tipo de abortos legais que se levam a cabo nos hospitais portugueses e como, confundindo números de abortos voluntários legais com os de abortos espontâneos e considerando que abortos de causa fetal não são abortos de fetos vivos, viáveis (e humanos, já agora), pois não sei que lhe diga, a não ser que tente informar-se -- a não ser que a sua ideia seja desinformar com a maior honestidade possível, ou seja, com base na sua própria e teimosa ignorância.

e depois, claro, há a questão fundamental para si e para todos os defensores do não. que, como muito bem disse odete santos ontem num debate com isilda pegado, partem para esta discussão, homens e mulheres, com uma ideia de base: as mulheres não têm capacidade para decidir. e deixadas decidir, decidem mal. por isso, acham, têm de as obrigar a decidir bem, no caso, ameaçando-as com prisão, julgamentos, multas, vergonha pública, trabalho a favor da comunidade e, não esquecer, as consequências de abortos feitos em parcas ou nenhumas condições de segurança.

trata-se, pois, de as obrigar a cumprir a sua função -- dizia isilda pegado, da 'federação pela vida', com notável quão enganadora candura: nenhuma mulher escolhe abortar se lhe forem dadas as condições para ter o filho.

para isilda pegado, 'dar condições' a uma mulher para ter um filho será, presumo, ensiná-la a bordar tapetes de arraiolos lá naquelas instituições de caridade a que pegado chama 'as nossas instituições', dar-lhes um tecto, farinhas lácteas, e, presumo, apoio afectivo e alguma formação profissional.

é destas 'condições' que falam, quando falam estas associações. não estão pois em condições de compreender que decidir, em consciência e responsabilidade, ter um filho é um pouco mais que isso.

como me parece impossível explicar a vlx que quando escreve, em resposta a um comentário, isto -- 'quem lhe garante a si que, numa situação concreta, a mulher que decide abortar se encontra numa circunstância traumática e dolorosa e não é antes, muito simplesmente, uma pessoa totalmente irresponsável e inconsciente? Pois é...' -- o que está a dizer é que não só não reconhece às mulheres capacidade racional e de auto-determinação (já sabíamos) como considera que, se uma mulher for, como ele diz, 'uma pessoa totalmente irresponsável e inconsciente' (o que do ponto de vista de vlx, é um pouco pleonástico), a melhor coisa que lhe ocorre é obrigá-la a ter, irresponsável e inconscientemente, um filho, para o criar irresponsável e inconscientemente. eis uma posição decerto muito consciente e responsável e, já agora, caridosa, do caríssimo vlx.


(não coloco links porque o mac não deixa, não porque esteja a pagar a vlx da mesma moeda. a minha maldade de mulherzinha inconsciente e irresponsável exprime-se de outras formas, e além disso gosto do mar salgado, tem lá pessoas selvaticamente admiráveis)
|| f., 12:45

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