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segunda-feira, janeiro 31

João Paulo II e Auschwitz (correio de um leitor)

Do António Marujo, jornalista do PÚBLICO especialista em temas religiosos, recebemos o seguinte mail:

"Há elementos suficientes para defender e atacar Pio XII, com o que ele fez e não fez. E os pedidos de desculpa - ou, mais exactamente, de perdão, que no conceito judaico e cristão, é uma coisa bem mais funda que a desculpa - já foram formulados por João Paulo II várias vezes - uma delas, bem significativa, em Março de 2000, junto do Muro das Lamentações. Será que o Papa tem que andar sempre a pedir perdão das mesmas coisas? E os governantes dos nossos governos ocidentais porque não pedem igualmente desculpa por terem acreditado tão tarde na história de que havia campos de concentração? Era Pio XII, confinado e quase preso nos palácios do Vaticano, que tinha que erguer a voz sozinho? E se o tivesse feito, isso teria sido útil à Resistência (alemã, francesa)? Talvez sim. Ou talvez não. Hoje, é mais fácil nós dizermos que sim...

Penso que é isso mesmo que está em causa: na cultura imediata que hoje
vivemos, parece-nos (ainda mais a nós, nesta profissão) que tudo tem
que ter pronunciamentos imediatos. Naquela época, as coisas talvez não
fossem bem assim. Bem, como o dito não me passou a tal procuração, bastará indicar-te aqui alguns dos elementos que tive que ler o ano passado (e que reli agora, por causa de um texto que estou a escrever): a polémica começou com uma peça estreada em 1963 - "O Vigário", de Rolf Hochhuth - em que um dos protagonistas diz que a culpa do que está a acontecer (Holocausto) não é do povo alemão, que não é pior que os outros povos, e que só o Vaticano poderia parar o extermínio. O Papa, calando, seria "um criminoso". O autor confessaria mais tarde não conhecer uma "radiomensagem" de Pio XII, no Natal de 1942, nem um discurso de Junho de 1943, em que o Papa dizia que havia “centenas de milhares de pessoas que, sem a menor culpa, às vezes só devido à sua nacionalidade e raça, foram escolhidas para morrer ou para ser gradualmente eliminadas”. Quem, entre os Aliados, dissera tal até aí? Não muitos...

Depois, também os episcopados da Alemanha, da Polónia, tinham escrito
muitas coisas contra o nazismo (cartas que foram lidas em todas as
igrejas da Alemanha, por exemplo, em 1937). E, entre os muitos casos de
judeus que agradeceram pessoalmente a Pio XII a sua acção, Golda Meir
disse: “Quando o martírio mais espantoso atingiu o nosso povo, durante
os dez anos de terror nazi, a voz do Pontífice ergueu-se a favor das
vítimas.” E o rabi de Roma, Elio Toaff, disse que foi salvo dos campos
por causa de um padre (houve milhares salvos em Roma, graças ao
Vaticano) e agradeceu a Pio XII. E Itzhak Ben-Zvi, que era presidente
de Israel quando Pio XII morreu, falou dos “sentimentos dos numerosos
refugiados judeus, salvos da morte e da tortura, pela intercessão de
Pio XII”. William Zuckermann, director da revista judaica dos EUA “Jewish
Newsletter”, escreveu: “Provavelmente, nenhum estadista daquela geração
tinha dado aos judeus uma ajuda tão poderosa [quanto Pio XII] na hora
da maior tragédia: a ocupação nazi da Europa. Aquilo que o Vaticano fez
foi uma das maiores manifestações de humanitarismo no século XX e
constituiu um novo e eficaz método para combater o anti-semitismo”.

Claro que se podem juntar outras tantas referências ao que ele não fez.
Falei sobre tudo isso nos textos que escrevi aqui no jornal. Mas agora,
como é para ti, acho que devo sobretudo mostrar-te o lado que tu não
viste.

Conclusão? Eu também teria preferido outras atitudes mais públicas. É
que sou jornalista e, além do mais, isso poupava-me agora estas
polémicas saudáveis."

|| JPH, 16:54

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